sábado, 12 de novembro de 2011

Capítulo I - Elena, uma rapariga sozinha no mundo;

       “Talvez devesse guardar isto na mente, mas o desejo desperta uma grande ansiedade em brotar todos os sentimentos cá para fora. Não apenas os sentimentos, mas também, os segredos mais obscuros e perigosos. Sim, perigosos. Os segredos que guardamos e as mentiras que deles advém podem causar acontecimentos catastróficos na nossa vida e na vida dos outros.”
        É assim que começa a história, escrita por uma jovem rapariga de Londres, de nome Elena, e era tão perfeita quanto o seu nome. Os seus pais, portugueses de origem, escolheram este nome inspirados na Helena de Tróia. Mr. e Mrs. DePaiva, eram grandes coleccionadores de objectos históricos, e igualmente, eram donos de uma empresa que organizava eventos culturais, que ao longo dos anos se foi expandido e Mr. DePaiva tornou-se um dos milionários mais conhecidos de Londres, organizando muitos dos mais importantes eventos por todo o mundo. Estavam sempre presentes em exposições de arte, teatros, ópera, ou até numa abertura de um novo museu. Idolatravam os deuses gregos, a história do império romano, as trevas da idade média e a ascensão da cultura contemporânea. Eram amantes da história, e por isso, deram à sua primeira e única filha o nome de Elena. E não poderia ser mais perfeito… digamos que, o seu nome, inspirado no nome da filha de Zeus e Leda, encaixava na perfeição da sua pessoa. Elena, 20 anos, era considerada a rapariga mais bela de King’s College London, e por consequência, como não podia deixar de ser, tinha uma lista enorme de pretendentes. Estudava Direito em King’s College, estava agora no primeiro ano, e não podia estar mais… desanimada.
          Ela queria muito ser advogada, sempre foi o seu sonho, mas não estava a aguentar a pressão, ainda pior quando não se tem ninguém com quem contar. A sua vontade era infinita, mas o facto de não ter um verdadeiro amigo deixava-a desanimada e sem forças para continuar. Os seus pais estavam quase sempre ausentes, ligavam-lhe apenas para perguntar sobre os estudos.
        Elena estava então, sozinha. Sozinha num mundo cheio de oportunidades, vida e cor. Mas que nada lhe dava a não ser preocupações e até mesmo desespero.
         "É pena não ter amigos verdadeiros, amigos que não se importem que eu seja como sou, que me aceitem não porque os meus pais são imensamente ricos, mas sim porque gostam da minha presença. É graças ao dinheiro, à fama e ao facto de nunca poder contactar com outros sem que me estejam constantemente a perguntar quando irá ser a próxima festa no meu apartamento - sim, porque todas as pessoas deliram ao saber que eu tenho um apartamento só para mim perto da faculdade, se ao menos elas soubessem o quanto me custa viver sozinha, e que, mesmo quando tenho a casa cheia de gente, com música ao altos berros, bebidas e drogas por todo o lado, me sinto tão isolada. Por vezes, gostava simplesmente que as pessoas deixassem de ser tão materialistas e começassem a olhar com outros olhos para quem eu sou, Elena Marie DePaiva, estudante universitária em Direito, uma pessoa normal… como todas as outras.”
      Para além do seu sonho de ser advogada, Elena gostava imenso de escrever, mantinha sempre o seu diário em dia. Não necessitava de escrever sobre o que se passava durante o dia, pois normalmente resumia-se a aulas e alunos da faculdade que a abordavam várias vezes, sempre com os mesmos diálogos: “És a Elena DePaiva, queres sair comigo?”, “Então Elena, como estão os seus pais?”, “Miss DePaiva, que honra a sua presença”. “Sim, sim, obrigada”, era o que lhes respondia ignorando cada uma das suas faces, cada um dos seus comentários.
            Elena escrevia sobre o que sentia, sobre as saudades que tinha da sua única amiga, uma verdadeira amiga, Louise. Louise era mais velha, 23 anos, morena com um cabelo muito grande e encaracolado, lábios grossos e um corpo sensualmente bem feito. Estudou em Londres durante muitos anos e conheceu Elena por acaso num café que ambas costumavam frequentar. Encontravam-se nesse mesmo café todos os dias. Louise era a sua maior (e única) conselheira, a sua confidente, o seu porto de abrigo. Normalmente as suas conversas baseavam-se em estudos, viagens, rapazes e sexo… coisas normais para duas pré-adultas. Louise era realmente uma pessoa muito viajada, e no que tocava a sexo, dava sempre as melhores dicas e conselhos do mundo. Para Elena era indiferente, pois sabia que não os iria utilizar enquanto não encontrasse alguém que realmente a amasse por aquilo que ela é, e não fosse para a cama com ela apenas pelo seu dinheiro, apenas como uma aposta, apenas como uma noite… Louise retribuía sempre com um sorriso cada vez que Elena lhe dizia que nunca iria utilizar nenhum dos seus conselhos, e sem hesitar dizia-lhe: “Lenny (nome que carinhosamente lhe deu) um dia, vais encontrar um homem maravilhoso e com ele vais ser muito feliz. Acredita, a tua primeira vez irá ser perfeita!” E Elena realmente acreditava, ou pelo menos, tentava acreditar na amiga, como sempre o fazia.
            Com a sua companhia, Elena nunca se sentia sozinha, era como se Louise fosse o seu anjo da guarda; alguém que desceu á terra para salvaguardar o espírito, a mente e o seu corpo. Infelizmente, Louise teve de partir, não conseguiu mais suportar as despesas de estar a estudar em Londres, e por isso, teve de voltar para casa dos seus pais. Elena tentou por tudo impedir que Louise saísse de Londres, disse-lhe muitas vezes que ajudava a pagar fosse o que fosse, mas Louise nunca aceitou um penny. Sempre lhe dizia: “eu não posso aceitar, está contra os meus princípios…”. Era sábia, esperta, e muito, muito orgulhosa de si. Fazia-se sentir a sua presença cada vez que entrava numa sala, tinha uma energia inesgotável que Elena sempre admirou, e claro, respeitou. Assim respeitou também a sua decisão, e teve de a deixar partir.
            No dia da sua partida, Elena levou Louise ao London City Airport, ia partir para Paris, ia para a sua cidade natal, ia voltar para as suas origens e deixar a sua melhor amiga para trás,  isto foi o que lhe disse:
            “Lenny, quero que saibas que eu não estive contigo pelo dinheiro, não tenho a tua amizade como um interesse, não quero nem nunca quis subir de estatuto social só por ser amiga de uma pessoa riquíssima, não Lenny, nunca foi isso! Tu és uma pessoa cheia de vida, uma rapariga com um coração tão perfeito quanto a tua cara, o teu cabelo, o teu corpo. Não penses nunca em ficar em baixo, não estragues nunca aquilo que és, por dentro e por fora…orgulha-te! Tem orgulho daquilo que és!”.
            “E assim, demos um enorme abraço, e nunca mais voltei a ver aquela rapariga morena com um cabelo caracteristicamente “afro”, como sinto a falta da minha Lu!”.
            Elena sentia a sua falta, sentia que sem os conselhos da sua verdadeira amiga, não iria conseguir aguentar muito mais tempo. Pensou muitas vezes em suicidar-se, mas a voz da Lu ecoava na sua cabeça e então recuava no pensamento.
            Era difícil, mas teria de suportar todo aquele sofrimento, sozinha.   

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