segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Capítulo II – As tentativas, a queda e a luz; (parte 2)


        “Ao início não me apercebi de quem era, e quando acordei ela ainda estava no meu quarto a arrumá-lo. Levanto-me com grande dificuldade e após esfregar os olhos vejo que ela sorri para mim e com a sua voz suave diz:
  -Bom dia, dorminhoca… já te sentes melhor?
Eu não queria acreditar nos meus próprios olhos, era ela, a Louise. Oque estava ela a fazer aqui? Como é que conseguiu voltar novamente a Londres? Senti um enorme alívio dentro de mim, apesar de sentir a minha cabeça pesada. Lu trouxe-me um pequeno-almoço fantástico e sentou-se a meu lado na cama olhando para mim com um misto de emoções. Consegui pressentir que me olhava com ternura por me voltar a ver, mas ao mesmo tempo o seu olhar era tão fatal como o de uma predadora a olhar para a sua presa. Sabia que ela me queria matar, ou pelo menos, dar-me um enorme sermão! Bem o merecia, e assim o fez.”
       Louise e Elena conversaram durante horas. Louise nunca disse uma palavra deixando sempre que Elena falasse, queria saber tudo, queria entender a razão pela qual a sua melhor amiga estava agora neste estado lastimável.
       “Louise, as coisas mudaram muito desde que te foste embora. Não aguentei a pressão do curso, não aguentei o facto de não te ter junto a mim todos os dias, não suportei a ideia de estar sozinha, e cada vez que aqueles abutres com desejo de subir de estatuto social se aproximavam de mim, apenas desejava que eles morressem ou que eu morresse ali mesmo. Não aguentei. Desisti. Eu sei, fiz mal, mas desisti, não suportei mais a ideia de ir as aulas todos os dias, não quis mais saber dos meus sonhos. Fechei-me em casa e durante uma semana não saí, pareceu-me quase um ano. Quando ganhei forças nas pernas, consegui sair, mas apenas tinha na cabeça a ideia de me suicidar. Eu queria, eu sentia que era o mais certo, sentia mesmo que já não valia a pena viver mais neste mundo. Quando estava prestes a fazê-lo, ouvi uma voz, a tua voz, tenho quase a certeza que eras tu, que me dizias “não!”, e por isso recuei, recuei mas não agi melhor a partir daí. As coisas simplesmente pioraram. Nessa mesma noite resolvi sair, fui a todos os bares e discotecas, produzi-me ao máximo e falei com todo o tipo de pessoas. E Louise, foi nesta noite que eu comecei a cometer o maior erro da minha vida. Vi um grupo de jovens, talvez um pouco mais velhos que eu a fumar algo que pessoalmente não conhecia o cheiro era intenso e inicialmente fazia-me imensas dores de cabeça… Para eles era um charro normal, para mim só me custou fumar o primeiro, porque os seguintes eram feitos a brincar. Ria-me imenso com eles, pelas razões mais disparatadas. Passámos a ver-nos todas as noites num beco aqui perto, sempre com o mesmo intuito, quanto mais fumava, mais queria fumar… Experimentei de tudo um pouco. E quando cheguei ao final do ano, comecei a snifar coca. Era uma sensação que me deixava completamente fora deste mundo, visto que não conseguia sair dele pela maneira que pensava ser mais fácil, optei por esta, e agora não consigo sair dela… Mas sentia-me tão bem, o problema é que já só me sentia bem com aquilo. No início deste ano, o mesmo grupo da noite deu-me a experimentar Ecstasy, e foi uma sensação que nunca irei esquecer, demorou cerca de 20 a 30 minutos a fazer efeito, foi o tempo de chegar-mos á “Disco” e começarmos a dançar. Posto isto, nunca mais me quis divertir sem ser com aquele efeito em mim, nunca mais quis saber do mundo real em que vivia, apenas queria consumir, divertir e ficar feliz. Mas estou tão errada, e é agora, com esta ressaca que sinto os erros cometidos, é agora ao ver-te que entendo pela expressão na tua face que deveria ter escolhido outro caminho. Desculpa, Louise.”
         A amiga apenas esboçou um sorriso e abraçou-a com muita força e disse-lhe:
 -Entendo o que sentes, sei que não é fácil, mas esperava que tivesses sido um pouco mais forte. Não o foste, mas não há problema, porque eu vou estar aqui durante uns tempos para te ver erguer. Vamos dar-te uma nova vida, vou fazer-te ver que há mais do que isto. No entanto, sabes que os próximos meses irão ser difíceis. Vais ter de deixar os vícios, vais ter de arranjar um emprego, mudar de estilo de roupa, mudar o corte de cabelo. Vamos a uma clínica e vais ser tratada como deve de ser. Voltarei para Paris, mas assim que o tratamento acabar estarei aqui para te ver… promete-me que não voltarás a fazer um disparate destes! Porque se o voltares a fazer, eu não saberei como reagir!
        Elena apenas abanava afirmativamente e olhava para os lençóis, olhou para a cara da amiga e questionou-se a si própria como seria possível ela estar ali, e como poderia ela entender toda esta situação. “Não hesitei e tive de perguntar:
 -Lu, como vieste novamente a Londres?
 -Os meus pais ganharam um prémio monetário razoavelmente alto num concurso, deu para pagar as despesas de avião até cá.
 -Porque vieste?
 -Tive um pressentimento que não estavas bem… Cheguei ontem e passei no café, mas o dono disse-me que desde há muito que não passavas por lá.
 -Sim é verdade, deixei completamente de ir lá. Mas disseste que entendias a minha situação, como assim entendes? Também já consumiste.
 -Não, mas o meu “ex” consumia. Foram tempos terríveis. Ele nunca me deixou ajudá-lo. Por isso quero ajudar-te, não vou aguentar ver outra pessoa de quem gosto a magoar-se por causa das malditas drogas. Por isso Lenny, deixa-me ajudar-te.
         Olhei-a fixamente, estava prestes a chorar. Só me lembrei de responder, “sim”. Nada mais dissemos uma à outra.
          Tomei o pequeno-almoço e ela não saiu do meu lado, quando acabei ela levantou o tabuleiro, eu olhei em volta e perguntei-lhe: “o que me fizeram ontem Lu? Como vim aqui parar, quase nua, que manchas são estas no meu colchão? Parece sangue, alguém se magoou?” Ela não se virou para mim, apenas disse: “arranja-te e vamos falar sobre o que aconteceu ontem, com mais calma.” Senti o tom da sua voz a tremer, assim como estava o meu corpo a pedir por mais uma dose de adrenalina, de alucinações. Foram as piores sensações da minha vida. Dependência e desilusão. O meu mundo não poderia ser mais imperfeito. Mesmo assim, a minha luz tinha voltado, e iria ajudar.me, iria guiar-me no meu caminho.”
           Apesar do esforço que fez, Elena acordava agora com a luz do sol a bater na cara, e com o sorriso iluminado de Louise no seu pensamento. Mesmo com a sensação de dependência estava tudo a correr pelo melhor… por agora. 

Sem comentários:

Enviar um comentário